De acordo com o Ministério da Saúde, são 11 casos por 100 mil habitantes. No Brasil o índice é de 5,5 casos por 100 mil habitantes. Dados do Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM) apontam ainda que Porto Alegre registrou em 2021 a maior taxa entre todas as capitais brasileiras. De acordo com o psiquiatra Leandro Ciulla, são muitos os fatores que levam a este grave problema de saúde pública no Estado. “O comportamento suicida pode estar ligado a fatores sociais, culturais e genético. Há também questões comportamentais a serem levadas em consideração, como o uso de droga e álcool, o isolamento social e a melancolia.  Independentemente da causa, a família e as pessoas que convivem com alguém capaz de praticar alguma forma de violência autoinfligida precisam estar sempre atentas”, alerta o médico.

 

Os veterinários  estão expostos a variados tipos de pressão emocional. Embora a morte seja uma consequência natural da vida, para muitos a perda de um animal em atendimento pode desencadear processos de depressão que culminam em suicídio. “Além disso, estes homens e mulheres vivem em condições de maior isolamento social e sua produção está condicionada aos intempéries climáticos. Sem contar, que as suas perdas financeiras, quando ocorrem, repercutem de forma a comprometer meses ou até um ano inteiro de dedicação”, explica. Por tentar reduzir estes tristes índices, a Campanha Setembro Amarelo –  iniciativa do Centro de Valorização da Vida (CVV), do Conselho Federal de Medicina (CFM) e da Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP) – propõe o envolvimento da sociedade no processo de acolher e mudar estas estatísticas. 

 

O primeiro passo, avalia o psiquiatra, é observar comportamentos que se manifestam de diversas formas, desde a automutilação, pacientes com recorrentes conversas sobre a morte e suicídio. Apesar de o país ter evoluído muito em vários aspectos, especialmente no campo da Medicina, alguns temas continuam cercados de preconceito. A saúde mental é um deles. E se o assunto for suicídio, o tabu é ainda maior. Várias pesquisas realizadas no país revelam que algumas categorias profissionais estão mais suscetíveis a práticas. Os profissionais estão entre os que mais tiram a própria vida. No caso dos médicos-veterinários, por exemplo, a atenção precisa ser redobrada, pois pesquisas internacionais revelam que a taxa de suicídio é 3,5 vezes mais alta entre eles do que entre o resto da população em geral.

 

As causas apontadas para esse fenômeno são, principalmente, a Síndrome de Burnout e a fadiga por compaixão. A primeira compreende o esgotamento emocional crônico por sobrecarga de trabalho e passou a ser reconhecida este ano como doença ocupacional pela Organização Mundial da Saúde (OMS). Já a segunda é uma síndrome que causa exaustão física e emocional em decorrência do custo empático de lidar com o sofrimento alheio. Estudos revelam, ainda, que nos Estados Unidos a saúde mental dos médicos-veterinários já se transformou em um problema sério. O presidente do Sindicato dos Médicos Veterinários do Rio Grande do Sul (Simvet-RS), João Batista Pereira Junior, está empenhado em evitar que a situação se agrave em solo gaúcho. “Há muitos colegas doentes, com estresse emocional, ansiedade e Síndrome de Burnout", atestou. "Nossa profissão nos impõe a produzir muito, fazer plantão e, por vezes, somos desvalorizados”, desabafou. 

 

De acordo com o dirigente do Simvet-RS, há uma sensação de impotência quando o tutor não faz o tratamento, não segue as recomendações, seja por falta de condições financeiras ou por não dar importância. "Sei que não conseguimos salvar a todos os animais, mas sempre fica a frustração pela morte", enfatizou. João Junior lamenta que o Brasil não tenha dados concretos sobre suicídio de uma forma ampla. "Por conta da falta desses dados, é impossível traçar as estatísticas das taxas de suicídios entre médicos-veterinários no país e, atualmente, são quase inexistentes as publicações sobre esse tema", assinalou. Segundo ele, é de extrema importância levar em consideração fatores sociais e culturais de cada nação, salientando que, no Brasil, é alarmante a questão da saúde mental entre os médicos veterinários. Por isso, é necessário que, cada vez mais, pesquisas e discussões sobre o tema sejam abordadas para conseguirmos mensurar e identificar as peculiaridades desse fenômeno no país.

 

João Junior revela que a rotina do médico-veterinário é cercada de dificuldades, incluindo a necessidade de comunicar más notícias, os desafios da relação médico-tutor, o procedimento da eutanásia, a sobrecarga de trabalho, o luto, os conflitos interpessoais e a desvalorização da profissão. "Somados, esses fatores  podem resultar no estresse laboral, com sérios prejuízos à saúde física e a mental", frisou. Para os profissionais que já apresentam comportamentos ansiosos ou depressivos é preciso que se mantenham em acompanhamento psicológico, pois a carga de trabalho pode influenciar nesses quadros. Mesmo os que não possuem "problemas", é importante a prevenção, a partir de diversas estratégias como psicoterapia e imposição de limites. A Síndrome de Burnout está diretamente relacionada ao ambiente de trabalho, que desencadeia estados de sofrimento psíquico do indivíduo, como ocorreu que os profissionais que atuaram na linha de frente da Covid-19. Essa síndrome é frequentemente encontrada em profissionais da saúde e com os médicos-veterinários não é diferente. 

 

Na prática veterinária, ainda existe um fator que pode potencializar os sintomas: a eutanásia. A identificação dos sintomas do Burnout muitas vezes passa despercebida, prejudicando ainda mais as condições emocionais e físicas. A relação dos tutores dos animais pesa. Para muitos, os animais de companhia não são simples mascotes, "mas filhos". Os pets se transformaram em membros da família e como tal têm a sua devida importância. Alguns pets viajam e dormem com os tutores, frequentem creches... São tratados como crianças, com direito à festas de aniversário e a presetes de Natal. Com essas mudanças na relação entre humanos e pets, a carga em cima do papel do médico-veterinário também sofreram alterações. "Com essas transformações, os médicos veterinários assumiram um novo papel na vida dessas famílias multiespécie. Essas novas demandas exigem novas estratégias do profissional, pois passaram a lidar com a expectativa, a pressão e uma cobrança maior dos tutores".

 

O luto por um animal de estimação não é um exagero, se considerararmos o lugar que ele ocupa hoje na sociedade, ainda mais com tanta gente que mora sozinha com um ou mesmo com vários deles. "Não se pode esperar algo diferente, se você o trata como membro da família. O laço que cada um cria com o animal de estimação pode estar estabelecido dentro de variadas nuances e intensidades. Não cabe determinar um padrão de normalidade ou dizer o que está certo ou errado. Quando a convivência com o pet é intensa, a vivência da perda também pode ser bastante difícil e dolorosa. Se a morte motivada por causas naturais, na velhice, já é sofrida para tutores e profissionais que atendem os pets, quando há necessidade de eutanásia, a dor é infinitamente maior. E pode ser o gatilho para o adoecimento emocional do profissional. Ajudam a prevenir a depressão leitura, aprender coisas novas, ter hobbies, viajar e se divertir. Essas práticas mantém a cabeça ativa e a ocupam com pensamentos positivos. A ciência já comprovou que cuidar do corpo reflete na saúde mental de forma positiva.

 

O combate ao suicídio pode começar com um simples diálogo. Afinal, uma pessoa que tem esse desejo sempre deixa pistas. Pode começar pelo excesso de responsabilidades e às vezes pela sensação de fracasso, por não conseguir cumprir com todas as tarefas impostas. Isso leva a um nível altíssimo de ansiedade, que pode chegar a uma depressão ou a um Transtorno de Ansiedade Generalizada (TAG). Em sinais de qualquer suspeita, acolher é o melhor caminho e logo procurar uma ajuda profissional, seja de um psicólogo ou psiquiatra e até dos dois profissionais, que vão atuar de forma multidisciplinar. São esses profissionais que auxiliam no diagnóstico do que está ocorrendo ao redor para evitar, por exemplo, o suicídio. 

 

Risco de suicídio

 

* Tristeza excessiva e falta de vontade para estar com outras pessoas
* Alteração repentina do comportamento com uso de roupa muito diferente do habitual, por exemplo
* Tratar de vários assuntos pendentes ou fazer um testamento
* Demonstrar calma ou despreocupação depois de um período de grande tristeza ou depressão
* Fazer ameaças de suicídio frequentes
* Mudança nos hábitos de sono e alimentação
* Perda de interesse em atividades prazerosas
* Uso e abuso de álcool e drogas